Atualmente, é comum observarmos vacas leiteiras criadas à base de pasto alimentando-se essencialmente de monoculturas de forragem, geralmente apenas gramíneas de gênero C3. Quanto aos animais confinados, uma característica comum dos sistemas é a alimentação regular, leia-se, os mesmos ingredientes e porcentagens ao longo do ano. Nestas duas situações é praticamente inexistente o emprego de leguminosas na dieta dos animais.
Embora o uso de pastagens consorciadas promova diversos benefícios ao solo e as plantas, como o aporte de nitrogênio no sistema por meio do processo de fixação biológica de N, e a melhoria da qualidade nutricional da pastagem, principalmente em termos de PB e digestibilidade, a prática ainda é muito pouco explorada por produtores brasileiros.
No entanto, além destes benefícios, o uso de pastagens consorciadas tem mostrado um potencial de modificar o perfil de ácidos graxos (ou gordura) do leite. Tal fato tem chamado a atenção de muitos pesquisadores acerca deste tema, impulsionados diretamente pela demanda crescente de consumidores cada vez mais preocupados com a qualidade nutricional dos produtos que consomem.
Na maioria dos casos, as pesquisas que avaliam o perfil lipídico do leite buscam o aumento dos ácidos graxos poli-insaturados, em especial o ácido linoleico conjugado (CLA). Shokryzadan et al. (2017) revisaram inúmeros estudos envolvendo o CLA e seus benefícios aos seres humanos, e os autores sentiram-se seguros em afirmar os efeitos benéficos do isômero CLA sobre o controle do peso corporal e também a inibição de diversos tipos de câncer em animais. No entanto, estas e outras questões como a diminuição do risco de doença cardiovascular em seres humanos ainda são controversos, embora os resultados preliminares sejam animadores.
Na literatura mundial, diversos estudos comparam sistemas à base de pasto com sistemas confinados e a influência disto no percentual de CLA no leite. Contudo, são escassos trabalhos que comparem apenas sistemas pastoris de monocultura com sistemas mistos. Os autores Rego et al. (2016), avaliaram vacas leiteiras da raça Holandesa em dois regimes de alimentação, em que no primeiro momento os animais foram mantidos em pastagem com suplementação de 5 kg de concentrado dia-1, e na sequência, os animais foram alocados em um confinamento no qual recebiam uma dieta composta por 60% de silagem de milho e 40% de concentrado. Após os 21 dias de confinamento as vacas retornaram a pastagem, que por sua vez era composta majoritariamente por azevém e trevo branco.
A concentração dos isômeros CLA no leite (g/100g de ácidos graxos totais) foi semelhante entre as duas etapas de pastagem, e estas, superiores ao período que os animais permaneceram confinados (1,71 e 1,58 vs. 0,85). Os mecanismos que explicam estas mudanças não estão completamente elucidados. Todavia, a principal hipótese é de que as leguminosas possuem compostos secundários, como os terpenos e os polifenóis que poderiam diminuir a taxa de biohidrogenação ruminal (Chilliard et al., 2007).
Lahlou et al. (2014) que trabalharam com vacas Holandesas confinadas versus animais à base de pastagem composta de 55% gramíneas e 45% leguminosas (trevo branco e vermelho) atribuíram a maior quantidade de CLA para os animais a pasto (1,06 vs. 0,71 g/100 g de ácidos graxos totais), devido aos polifenóis do trevo vermelho, os quais também poderiam proteger os lipídeos da biohidrogenação no rúmen.
Embora o mecanismo de ação destes compostos ainda não esteja totalmente claro, os resultados de pesquisa evidenciam a influência do consumo de leguminosas na composição do leite de vacas. Ao mesmo tempo, os trabalhos têm demonstrado que o consumo de produtos ricos em CLA parece ser promissor para a saúde humana. Aqui, gera-se então uma hipótese de que alimentar vacas com pastagens consorciadas pode ser uma alternativa para enriquecer ainda mais a qualidade nutricional do leite. Neste contexto, abre-se o precedente: podemos futuramente explorar este nicho de mercado?
Autores do artigo:
Daniel Augusto Barreta e Beatriz Danieli > Zootecnistas e mestrandos do PPGZOO UDESC.
Ana Luiza Bachmann Schogor > Zootecnista, Professora Doutora do Departamento de Zootecnia da UDESC Oeste
A produção animal, em grande parte das regiões tropicais, é limitada principalmente, pela variação de qualidade da forragem em oferta ao longo do ano. Essa qualidade é reflexo da concentração da produção no período das chuvas, com grande oferta de forragem, porém, em contradição nas demais estações do ano, com baixa oferta e qualidade, afetando diretamente a produção animal. Além disto, as gramíneas tropicais possuem menor qualidade de forragem do que as gramíneas de clima temperado e a introdução de leguminosas adaptadas nas pastagens tropicais resolvem problemas como a baixa disponibilidade de nitrogênio e os baixos teores de proteína na dieta dos ruminantes.
A consorciação é uma prática que permite associar numa mesma área o plantio de culturas diversas para aumentar o rendimento, enriquecer a vida biológica do solo e protegê-lo contra a erosão. Podendo também ser considerada como uma técnica agrícola de conservação que visa um melhor aproveitamento em longo prazo do solo, bem como o cultivo na qual se utiliza mais de uma espécie de planta na mesma área e no mesmo período de tempo (Peixoto et al., 2001). Sendo algumas espécies mais adaptadas à consorciação, como os gêneros Stylosanthes, Arachis, Leucaena, dentre outras.
Mas para a adoção dessa técnica é necessário avaliar alguns pontos críticos do processo, como as diferenças morfológicas entre leguminosas e gramíneas forrageiras, em que as gramíneas são mais eficientes na utilização de água, de alguns nutrientes minerais e apresentam uma eficiência fotossintética mais alta, que resulta na taxa de crescimento e potencial de produção de forragem superior ao das leguminosas (Nascimento Jr., et al., 2002). Ressaltando também sua forma de crescimento e propagação diferenciada, onde a gramínea é mais agressiva e competitiva, pela presença de perfilhos e ramificações, já a leguminosa apresenta grande dependência da planta mãe, custando a possuir vigor e eficiência própria.
Dentro desses critérios, o manejo deve ser direcionado para favorecer as leguminosas, porém sem comprometer a produtividade das gramíneas, escolhendo uma associação compatível entre a gramínea e a leguminosa, em que as condições climáticas não sejam limitantes, assegurando um suprimento adequado de nutrientes, para otimizar o crescimento da leguminosa forrageira.
Dentre os benefícios do uso de leguminosas estão a melhor qualidade do pasto; maior ganho de peso animal; economia nos gastos com adubação nitrogenada; recuperação de áreas degradadas; maior cobertura de solo e melhor proteção, além da garantia de um processo não poluente e ambientalmente correto.
O melhor desempenho animal em pastagens consorciadas é explicado por apresentarem em geral melhor valor alimentício em relação às gramíneas. Maiores níveis de proteína bruta e de digestibilidade são os atributos mais marcantes (Pereira, 2002).
O uso de leguminosas em pastagens vem para suprir os níveis de nitrogênio que, ao longo dos anos, acaba se tornando insuficiente para o desenvolvimento satisfatório das gramíneas, logo, a consorciação em pastagens é uma forma de aumentar o aporte de N no sistema, uma maneira econômica.
Não se trata de uma novidade para o pecuarista, embora o emprego desta técnica, anteriormente, tenha implicado em limitações pela própria falta de tradição e conhecimento dos pecuaristas, e técnicos em usar e manejar adequadamente as pastagens consorciadas.
Dheyme Cristina Bolson, Graduanda em Zootecnia – UFMT, Campus Sinop;
Dalton Henrique Pereira, Professor da Universidade Federal de Mato Grosso, Campus Sinop;
Bruno Carneiro e Pedreira, Pesquisador da Embrapa Agrossilvipastoril.
ESCOLHA DE FORRAGEIRAS PARA A PRODUÇÃO DE LEITE.pdf
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